é só mais letras.

sábado, 14 de janeiro de 2012

Sobre um sábado eterno



O noticiário jamais me fez chorar como daquela manhã. Sua foto ocupando toda minha TV pequena, a foto que tiramos em maio no parque do sul, seu sorriso estava agora tomando parte da tela pequena, seus olhos espremidos agora estavam apagados. Consigo imaginar a cena narrada pelo moço da TV: Seu corpo no escuro chão do banheiro, algumas manchas de sangue, remédios... Mas tinha algo que o repórter não descreveu, mas consegui imaginar: Era sua dor, ali toda derramada no piso negro, espiradas nas paredes. 

Uma dor minha, uma dor que comecei a sentir e que dificilmente me deixaria viver.

Fiquei um bom tempo sentado na cama, mesmo depois do moço do noticiário se calar, mesmo depois do jornal anunciar o seu fim e mesmo depois de começar uma seqüência interminável de desenhos animados... Eu não conseguia me mover, fiquei imóvel sentado na minha cama, tão repentinamente fria, chorando baixinho. Meu anjo tinha lhe arrancado as próprias asas e resolveu voar sem elas, caiu, quebrou, morreu, se matou.

Levantei depois de longos minutos imóvel, e devagar caminhei ate a cozinha. Preparei café, um café pra dois... E comecei a lhe redigir uma carta.

Oi meu Amor, é egoísta te chamar de minha. Mas quando você se foi, foi sendo minha. Minha doce e pequena Eliza...

Seus olhinhos agora estão brutalmente fechados em algum lugar onde te levaram, queria poder lhe entregar sua xícara com o café quente e amargo que fiz hoje e conversar sobre como foi fria a madrugada sem seus braços envoltos a minha cintura, mas quero lhe pedir perdão. Perdoa-me por não poder lhe salvar dos teus próprios pensamentos, e por diversas vezes ter provocado cada um deles. Perdoa-me por ter te tirado da minha casa quando você mais precisava de um lar. Perdoa-me por lhe roubar os mais belos sorrisos e por ter sido, a mim, que as tuas mais doces palavras foram endereçadas, mas se lhe conforta hoje sou feito de fel. Sei que não lhe confortará, pois não pode mais ver minha amargura, os teus olhos se fecharam... Para sempre. Mas por favor, perdoe-me.

Eliza hoje vou comprar um buque de flores para lhe dar, sei que sempre me pedia para que eu lhe enviasse flores em seu trabalho, mas nunca tive tempo, me desculpe por resolver ‘colhe-las’ somente agora quando já não pode sentir o perfume de cada uma das pétalas, nem mesmo poderá ver meus olhos inchados e meu corpo desfalecendo sobre ti. Mas prometo que as flores serão uma das mais lindas e belas que encontrar no caminho ao teu velório, já que a mais linda flor que conheci murchou. Vou cantar pra ti Eliza, com minha voz fraca e falha, Vou cantar sua falta.

Mas uma vez Perdoe-me por não lhe  amar devidamente, mas amei do jeito que pude. Ainda que fosse torto e lhe machucasse com os espinhos que não soube cortar, eu lhe amei. Vou te amar pra sempre com os restos que me sobraram, minha Eliza.



Eu soube de algumas coisas esta manhã, umas quebraram-me ao 
meio de tal forma que nada será capaz de concertar-me. 
Outras eu soube que seria minha rotina... 
Escrever cartas a ti e lhe entregar flores.
Desculpe-me por não poder te salvar...




Alinne Ferreira

5 comentários:

  1. que lindo esse, alinne! mesmo, maravilhoso :3
    a parte do "a mais linda flor que conheci, murchou" eu fiquei muito :cccc
    você escreve muuuuito bem!

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  2. Achei lindo, Alinne! Dolorido, sincero e todo cheio de poesia.
    Acho bacana quando vejo uma menina se colocando num papel de narrador masculino. Deu pra ver que sai de dentro do coração. Essa é uma virtude de quem escreve bem.

    Enfim, foi um prazer encontrar seu blog hoje.
    Beijos.

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  3. Que tristeza menina, mas isso só aumentou o encanto desse texto... É incrível como a gente às vezes precisa perder certas pessoas para lhes dar o devido valor e atenção.

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  4. seus textos tristes me comovem, acho que é por isso que nos identificamos tanto...

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  5. Parabéns pelo blog Alinne, adorei *-*
    Voltarei..
    Se tiver um tempinho da uma passadinha pelo meu
    http://laranjaselimoes.wordpress.com/
    Xoxo!

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